Seguidores

13 de setembro de 2017

Algoritmos e autocompletar: Como a tecnologia decide nosso futuro!

        Computadores podem prever o futuro? Nós queremos desesperadamente que o façam, se contarmos a simples tonelada de histórias de ficção científica que consumimos ao longo das décadas contendo oráculos tecnológicos que tudo sabem, usando seu imenso poder de cálculo para chegar a cada detalhe da mesma forma que o Deep Blue da IBM joga uma partida de xadrez.
As magníficas Minds (Mentes) que modelam o comportamento de civilizações inteiras ao mesmo tempo em que calculam os saltos pelo hiperespaço nos romances "Culture" de Iain M. Banks. C-3PO recitando as chances de sobrevivência para Han Solo em "Star Wars".
Por ora, entretanto, os videntes de silício não estão profetizando o futuro distante como deuses de IA. Em vez disso, eles estão ingressando no futuro próximo, estendendo gradualmente o alcance do que engenheiros de computação chamam de forma variedade de previsão, antevisão ou antecipação. Carros autônomos pisam no freio segundos antes de um acidente ocorrer.
Algoritmos de compra e venda de ações preveem flutuações de mercado com milissegundos crucias de antecedência. Ferramentas proprietárias preveem as próximas canções e filmes de Hollywood que farão sucesso. As formas com que a computação está se aproximando do futuro me recordam uma velha frase de William S. Burroughs: "Quando cortamos o presente, o futuro vaza". 'Os futuros nos quais pode pensar os futuros que você pode prever, são moldados pelo código de alguém. '
Melhores previsões do futuro próximo também estão começando a aparecer em todo tipo de produto de consumo. Costumávamos rir das malucas recomendações da Amazon e do infame Clippy da Microsoft, que aparecia para "ajudar" de forma ineficaz a escrever uma carta no Word, mas as previsões que vemos atualmente parecem com maior frequência assustadoramente precisas.
Considere o autocompletar do Google, aquela pequena série útil de textos sugeridos que aparece quando você começa a digitar no campo de busca. Como um gênero de profecia, isso pode parecer bem bobo. Mas considere com que frequência o usuário típico de internet faz uso dessas pequenas sugestões todo dia, as utilizando não apenas para economizar na digitação de algumas letras a mais, mas como uma espécie de minibusca por conta própria: uma rápida checagem ortográfica, uma checagem de fatos e "zeitgeist", tudo mesclado em uma coisa só.
O nome que você está pesquisando aparece junto com "namorada" ou "casada" depois dele? O que o Google sugere após você digitar "como eu"? (As sugestões do Google para mim foram "chego em casa; renovo o passaporte; tiro um passaporte; te amo". Obrigado, Google.).
Essas previsões se baseiam nas palavras que milhares de outras pessoas digitam nos campos de busca, mas também são personalizadas para você com base em seu próprio histórico de navegação, localização e o que quer que o Google use como referência em seu extenso arquivo a seu respeito.
Isso pode parecer uma conveniência banal, mas também é uma forma de reinventar o relacionamento que todos temos com o "agora" e o "logo". Anos atrás, o Google percebeu que as pessoas se irritam com demoras no tempo de resposta, mesmo que sejam de menos de um segundo.
De fato, os seres humanos podem se incomodar com qualquer atraso que seja perceptivelmente maior do que a velocidade com que nosso próprio sistema nervoso pode ser capaz de responder a estímulos (cerca de 250 milissegundos). Assim, caso o Google queira oferecer algo para você agora, ele luta para fazê-lo no mesmo tempo que leva para seu pé informar que você deu uma topada com o dedão.
Ao fazê-lo, ele amplia os limites do que é possível em gratificação instantânea, ao tentar adivinhar o que você deseja antes que você possa articular. O autocompletar salta à frente do agora para lhe oferecer o futuro próximo em uma bandeja de prata.
A qualidade preditiva do algoritmo se torna mais interessante quando você pega uma sugestão do autocompletar que não era bem o que você estava pesquisando, mas perto o suficiente para você aceitá-la por ser um mamífero preguiçoso. Pois nesse caso de sua busca sobre gatos ou ansiedade com palhaços, o Google não apenas previu o futuro, mas o mudou. Agora, multiplique essa possibilidade pelas 3,5 bilhões ou mais de buscas que a empresa processa por dia.
Outro tipo de moldagem do futuro
O autocompletar é apenas um pequeno exemplo das muitas formas com que as previsões por algoritmos moldam o futuro. Pense em seu relacionamento com o Facebook: a principal fonte de notícias para muitas pessoas.
A rede social emprega enormes recursos preditivos para descobrir como encher seu feed com conteúdo e conexões que façam você voltar ao site. Você é liberal ou conservador? Rico ou pobre? Qual é sua etnia, sua localização geográfica, sua marca favorita de roupas? Os anunciantes também querem saber e contam com a capacidade cada vez mais formidável do Facebook para aprimorar sua demografia, influências e preferências.
À medida que os anúncios se tornam mais bem direcionados, maior é a probabilidade deles de influenciar os produtos que você compra os presentes que recebe as viagens que faz o bairro no qual vai morar, ou quando tomar grandes decisões, como mudar de emprego ou se casar.
E as decisões dos algoritmos a respeito de com quem compartilhar o próximo grande evento de sua vida manterão o loop de feedback para outros. Esses dados também podem ser usados para discriminá-lo. Já pode tê-lo feito, como ocorreu com um velho sistema de anúncios do Facebook, que permitia aos clientes excluir "afinidades étnicas" específicas de verem anúncios de imóveis residenciais, crédito e emprego. (A empresa agora alega que implantou políticas que previnem esse tipo de discriminação deliberada).
Mesmo se não houver uma enorme pasta parda em Palo Alto rotulada de "negros no Facebook", os algoritmos são escritos de forma instrumental para considerar diferenças demográficas percebidas. O programa encherá seu feed de postagens e anúncios que ele acha que você (ou melhor, o entendimento dele às vezes incrível, mas no final impreciso, de você) gostará cada um com o potencial de se transformar em uma profecia que se autorrealiza do que você gostará.
O feed parecerá semelhante para aqueles que ele achar que são semelhantes a você, mas muito diferentes para alguém que ele associar com outras categorias demográficas e sociais.
Esse é outro tipo de moldagem do futuro: ele manipula a informação sobre a qual estamos cientes, não apenas as coisas nas quais nos concentramos, mas as coisas no horizonte sobre as quais estamos vagamente cientes. Mas essas coisas nas margens com frequência voltam e se transformam no futuro. Como temos uma capacidade limitada de pensar nas decisões que não se encontram no agora imediato, vislumbrar algo de canto de olho (digamos, uma propaganda de uma marca de tênis que seus amigos no Facebook gostam) pode influenciar você posteriormente, porque o anúncio coloca aquele tênis em uma lista curta de coisas que você pode vir a querer posteriormente.
Também facilita para você a decisão de comprar tênis daquela marca (um fato que os anunciantes conhecem muito bem). Nossos algoritmos se infiltram bem ali, entre nossa complacência e nossa ansiedade para preencher as lacunas. Aquele anúncio de uma imobiliária ou de anel de noivado pode estar próximo o bastante da coisa que achávamos que queríamos a ponto de ser mais fácil apenas clicar nele. Mas ao fazê-lo, nos tornamos as versões rasas de nós mesmos previstas pelo algoritmo e, no caminho, limitando as possibilidades de nossa experiência. Mamíferos preguiçosos.
Esse tipo de previsão apenas se tornará mais predominante, assim como mais sedutora em sua conveniência, à medida que os algoritmos melhorarem e os alimentarmos com mais dados com nossas buscas, nossos aparelhos domésticos inteligentes, nossas atualizações nas redes sociais e nossos crescentes arquivos de fotos e vídeos. O Facebook está próximo, literalmente, de ler sua mente.
Em sua conferência anual de desenvolvedores, ele apresentou uma nova tecnologia que pode transcrever texto diretamente do pensamento. E se, como o autocompletar, o texto for quase o que você pensou? E se seu cérebro, uma ferramenta incrivelmente adaptável, moldar seu pensamento para se tornar mais adequado ao algoritmo, e você se ver pensando no Facebook, assim como você ficou sonhando em francês por semanas antes da grande prova do Advanced Placement (programa para ajudar a ingressar na faculdade)? Agora, os futuros nos quais pode pensar são moldados pelo código de alguém.
Essa é uma versão extrema de como os computadores podem vir a prever o futuro, ao menos em seus detalhes particulares. Mas em relação ao futuro de forma geral, isso acontece o tempo todo. Nós cortamos e picamos o presente em milhões de diferentes modelos, fazendo todo tipo de suposição sobre o que podemos e não podemos prever.
Quanto mais dependemos de computadores para lidar com o futuro próximo para nós (para que lado eu viro? O que devo ler? Com quem devo sair?), mais limitado se torna nosso mapa do presente e o futuro potencial. Nós invertemos William S. Burroughs: cortando o futuro e o transformando em pedaços distintos do presente desnaturados de ambição, mistério, dúvida e de um propósito humano mais profundo. Podemos obter uma resposta para nossa pergunta, mas não sabemos o que ela significa.
Para a maioria de nós, a maior parte do tempo não é o futuro nebuloso, de longo prazo, que importa. São os próximos cinco minutos, o dia seguinte, a próxima linha de conversa. Essas são as previsões que os algoritmos desejam fazer por nós ao moldarem as decisões reais que movem nossa vida adiante. Mas o futuro não se resume às futuras decisões em nosso campo de visão. É o espaço em branco no mapa, a zona de possibilidade e esperança. Nos melhores dias, é o telescópio pelo qual vemos a melhor versão de nós mesmos finalmente se concretizando.
Mas esses algoritmos podem ser tão atraentes nas formas que acabam mapeando nosso futuro próximo a ponto de obscurecerem as mudanças lentas e dramáticas que podem levar décadas para se realizar. Os algoritmos são tão eficazes em preencher cada momento disponível de tempo livre com "pings" e atualizações que excluem oportunidades vitais para sonhos e autorreflexão: os momentos em que você de repente percebe que precisa largar seu emprego ou escrever um livro ou mudar quem somos.
Todos já tivemos essa experiência de descoberta de uma nova versão de nós mesmos, totalmente imprevisível por qualquer modelo. Esses futuros não são algo que deveríamos entregar aos cuidados de um algoritmo.

Autor: Ed Finn - Publicado no The New York Times
Tradutor: George El Khouri Andolfato


Nenhum comentário: